Os principais programas de assistência alimentar foram praticamente extintos do Orçamento apresentado pelo governo federal para 2023. Ações importantes tiveram cortes que variam de 95% a 97% na verba prevista para o próximo ano, como o Alimenta Brasil. O aumento de verbas para esses programas passa a depender do interesse de repasse de parlamentares por meio de emendas ou de negociação antes da votação do Orçamento, que normalmente ocorre em dezembro.
Os atingidos são principalmente pequenos agricultores e comunidades tradicionais, como quilombolas. O programa de cisternas, que permite acesso à água para consumo humano e produção de alimentos, está praticamente paralisado desde 2021 e segue sem previsão de verbas para 2023. Com o encolhimento dos repasses, esses grupos deixam de ter renda e de ampliar a integração de suas produções, diminuindo a oferta nutricional do que conseguem consumir.
O impacto
“Famílias agricultoras em situação de insegurança alimentar grave enfrentam muitas vezes a condição da terra insuficiente para plantar ou falta de acesso à água para produzir na estiagem”, diz Silvio Isoppo Porto, professor da UFRB (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia) e ex-diretor da Conab
(Companhia Nacional de Abastecimento).
“A possibilidade de acesso ao mercado por meio do governo federal é fundamental para contribuir na ampliação da diversificação produtiva e no acesso à renda”, afirma. Uma pesquisa divulgada em junho mostrou que mais da metade (58,7%) da população brasileira convive com insegurança alimentar em algum grau, o que significa 125,2 milhões de brasileiros.
Recursos
Os programas com verba quase zerada ficam sob o comando do Ministério da Cidadania, o mesmo que paga o Auxílio Brasil, principal aposta de Jair Bolsonaro (PL) à reeleição. O orçamento da pasta para 2023 cresceu 32% para atender maior a número de beneficiários do Auxílio Brasil. Mas esse dinheiro não
vai para as ações de segurança alimentar e nutricional ou de acesso à água.
A verba destinada para o Alimenta Brasil foi reduzida em 97%, para R$ 2,6 milhões. Em 2010, recebeu R$ 622 milhões, mas tem sofrido cortes nos últimos anos. “A redução dos recursos tem impacto direto sobre famílias agricultoras, comunidades tradicionais e povos indígenas, que deixam de produzir e comercializar”, diz Porto.
Apesar do corte, Bolsonaro disse no horário eleitoral gratuito que o Alimenta Brasil é uma
das prioridades do seu governo, caso reeleito.
Consequências para empreendedores
Maria Conceição Ferreira é produtora e presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Feira de Santana (BA). Ela afirma que os cortes de recursos para compra de alimentos da pequena
agricultura trouxeram vários prejuízos, em especial pela redução do Alimenta Brasil.
“A gente se organizava a partir das associações, e a produção era toda comercializada (com o governo). Com esses cortes, gerou desemprego e falta de oportunidade. Se eu não tenho para quem mandar esses alimentos, eu também não tenho muito o que produzir”, diz. Segundo ela, o volume de compra caiu em torno de 90% nos últimos anos.
Para tentar amenizar os prejuízos, Ferreira diz que as entidades têm organizado feiras e espaços para que os agricultores vendam diretamente os seus produtos, mas afirma que eles não suprem o que foi perdido com a queda de compras governamentais.
“Isso não tem uma resposta imediata. Com a compra de alimentos pelo governo, a gente produzia já sabendo a quantidade e que o recurso estava garantido. Hoje é aventurando: posso levar meu produto para a feira e não vender nada. Isso impacta diretamente na renda da família”, afirma.
Com informações do Uol